sexta-feira, 1 de outubro de 2010

COMO O BRASIL QUER CONQUISTAR HOLLYHOOD!



No campo da cultura, 2010 está definitivamente marcado como um ano de polêmicas. Somaram-se as propostas de reforma da Lei de Direitos Autorais e da Lei Rouanet, as restrições à liberdade de imprensa e, agora, a indicação brasileira do filme Lula, O Filho do Brasil, de Fábio Barreto, para concorrer a uma vaga na disputa do Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira. Todas elas têm um elemento em comum: a disputa de limites entre os interesses governamentais e os do setor cultural.

A megaprodução Lula, O Filho do Brasil, feita sobre a biografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi escolhida por unanimidade para representar o Brasil no Oscar por intermédio de uma comissão técnica. Foram quatro representantes indicados pela Academia Brasileira de Cinema, dois pela Ancine (Agência Nacional do Cinema) e três pelo Ministério da Cultura. Há, como se vê, uma maioria de representantes estatais, mas o presidente dessa comissão, cineasta Roberto Farias, garante que não ocorreu nada de político na escolha: "Algumas pessoas julgam que houve influência política. Não houve. Os membros dessa comissão acreditam que esse é o melhor filme para o Oscar, não por juízo de valor artístico ou estético, mas pela possibilidade de ser bem recebido lá em Hollywood", afirma.

Fora da comissão, porém, a aceitação do filme não foi consensual. Muito pelo contrário. Nomes importantes da área, como o cineasta Alexandre Stockler e o crítico Rubens Ewald Filho, contestam veementemente a escolha. "Como cinema não é o melhor que nós temos, é uma produção que veio errada desde a maneira como nasceu, com aquele gasto todo de dinheiro", diz Stockler. Para apimentar ainda mais a discussão, houve uma clara discordância do público com o resultado, manifesta numa enquete promovida pelo próprio Ministério: Lula, O Filho do Brasil ficou em 6° lugar, com 1% dos votos, bastante atrás de Nosso Lar (70% dos votos) e Chico Xavier (12% dos votos).

Helia Scheppa/AE

E assim o Brasil viaja para o Oscar

Polêmica formada, o DCultura foi ouvir a sociedade e a classe artística a respeito do assunto. A elegante Glória Kalil declinou educadamente, o provocador Antônio Abujamra não polemizou – "eu já apanhei tanto por falar desse tipo de assunto..." –, mas outros tantos fizeram o debate crescer.

O primeiro ponto de discórdia vem dos que consideram que a indicação deveria se pautar em atributos estéticos, bastante questionados em Lula, O Filho do Brasil. Apenas um dos entrevistados pelo DCultura, o veterano compositor Billy Blanco, considera o filme bom artisticamente: "É forte em todos os pontos!" A maior parte faz ressalvas. Para a atriz Vida Alves, presidente da Associação dos Pioneiros da Televisão, o filme é "um pouquinho simples para o Oscar". O jornalista Reinaldo Azevedo, crítico ferrenho do lulismo, autor dos livros O País dos Petralhas e Máximas De Um País Mínimo, vai mais longe, dizendo que o filme é pateticamente ruim. "Evidentemente, se trata de uma indicação política. Onde quer que a cultura seja financiada pelo Estado tem isso: a melhor forma de as pessoas que precisam desse capilé demonstrarem sua independência é mostrar sua sabujice", dispara.

Da receptividade majoritariamente fria da crítica e do público – lembre-se que, além da derrota na enquete do Ministério da Cultura (veja também, os números da enquete promovida pelo site do DC), o resultado nas bilheterias foi amplamente tido como aquém das expectativas – vem outra parte do espanto que acompanhou a indicação. "É uma decisão curiosa escolher um filme tão polemizado pela crítica e não tão expressivo comercialmente", diz a cineasta Daniela Thomas. O fotógrafo e professor universitário Cristiano Mascaro segue a mesma linha. "O filme não teve críticas favoráveis nem sucesso de público. Se fosse uma indicação vinda de um órgão do governo, eu acharia 'normal'. Mas vindo de um júri com gente qualificada, como foi, acho estranha", comenta.

A comissão do Oscar, como disse Roberto Farias, não se prendeu aos méritos artísticos, mas às possibilidades de repercussão do filme nos Estados Unidos. Os grandes trunfos seriam, aí, a biografia do presidente e o seu prestígio no exterior. "É um filme profissional e conta uma história de superação, algo de que os americanos gostam muito. Então, como história, nos parece ter alguma chance. Acrescento a isso o fato de Fábio Barreto já ter tido uma indicação para o Oscar com O Quatrilho e não ser um diretor desconhecido", justifica.


Em princípio, o interesse do enredo é evidente. Mesmo que se discuta se a história do sindicalista que virou presidente foi contada com fidelidade, como pede o maestro Júlio Medaglia, não dá para negar que a matéria-prima seja instigante. O jurista e desembargador aposentado Walter Maierovitch conta que não costuma assistir a filmes que pareçam laudatórios a pessoas públicas, como o indicado brasileiro, mas confirma a grande atenção que a trajetória de Lula desperta no exterior. "O interesse sobre o Lula na Europa é enorme. Estive na última reunião da FAO (Food and Agriculture Organization, ligada à ONU), em Roma, e ele reuniu mais gente do que o próprio Papa. Isso pode ser um atrativo do filme", exemplifica.

Há, contudo, quem desconfie do peso da história e do prestígio de Lula na disputa do Oscar. Rubens Ewald Filho, experiente em comissões e coberturas da premiação, acha que os norte-americanos podem ter uma reação bastante adversa. "Eles gostam de ver tudo, menos a geografia, a cara do lugar. Um político local, então, é o que há de mais inadequado", acredita. Na sua opinião, se houve algum direcionamento político, o tiro vai sair pela culatra. "Não há precedentes de um governo mandar um representante oficial que louve o seu próprio governante. Eles vão ficar de orelhas em pé, pensando que estão diante de um cara com pretensões a Mussolini", prevê.

A cantora Nana Caymmi, intérprete de uma canção de Lula, O Filho do Brasil, reforça o argumento. "Nesses prêmios, se uma indicação fica em dúvida, como nessa possibilidade de uso político, cai em seguida", diz. Já o cineasta e ex-Secretário da Cultura de São Paulo João Batista de Andrade, levanta outro problema. "O pragmatismo da comissão é uma ilusão. Não vi nenhum filme sobre líderes estrangeiros, nem sobre o Mandela, ganhar o Oscar", afirma.

João Batista, contudo, pensa que a polêmica da indicação ao Oscar desvia a atenção de problemas mais profundos. "Acho um pouco ridícula essa atenção ao Oscar, festa de uma indústria estrangeira que ocupa mais de 90% do mercado brasileiro. A preocupação da política cultural, para mim, deveria ser aumentar o espaço da produção nacional e levar as classes mais pobres para o cinema", ataca. José Wilker, ator e comentarista da transmissão do Oscar na Rede Globo, bate na mesma tecla: "Acho que se dá uma excessiva importância à presença do Brasil no Oscar. O que a gente tem de almejar é a adesão do público ao nosso cinema", argumenta. Ambos têm razão. É preciso notar, porém, que a banalidade da indicação ao Oscar só ganha tanto relevo pela proximidade do Estado. Sem esse peso institucional, a questão talvez ocupasse, apenas, o esperado lugar de uma curiosidade. Se

FONTE:http://www.dcomercio.com.br//especiais/2010/lula/

Nenhum comentário:

Postar um comentário