MATHEUS MAGENTA – do BOL Notícias e do Folha.com
Leandro Firmino, o Zé Pequeno, continua atuando, participou da série... |
..."A Diarista", do longa "Cafundó", de Paulo Betti, e da peça "Woyzeck", dirigida por Cibele Forjaz (foto: Felix Lima/Folhapress) |
Ao longo dos dez anos que
sucederam sua pré-estreia no Festival de Cannes, o filme "Cidade de
Deus" viu sua estética reverberar no cinema brasileiro em obras como
"Tropa de Elite" e seu elenco de jovens atores se dividir entre o
sucesso, o ostracismo e a marginalidade. Um deles, que fez parte do criminoso
Trio Ternura no filme como o personagem Alicate, se envolveu com drogas e hoje
está desaparecido.
Thiago Martins, o Lampião (um dos integrantes do Caixa Baixa), protagonizou o filme "Era Uma Vez", de Breno Silveira,.... |
e está no elenco da novela das 21h "Avenida Brasil" |
"Ele saiu da ficção para a
realidade. Virou traficante e hoje está desaparecido. O menino tinha arte, mas
ele não soube administrar a potência do sucesso que o filme teve."
O relato acima sobre o destino
incerto de Jefechander Suplino foi feito à Folha pelo cineasta Luciano Vidigal.
Ao lado de Cavi Borges, ele filma um documentário para mostrar o destino dos
atores dez anos após a primeira exibição do longa de Fernando Meirelles, em
maio de 2002.
"Uns souberam aproveitar
as oportunidades, outros viram que não tinham jeito para a coisa e seguiram
outras carreiras. E há aqueles que se descobriram atores ou se deslumbraram, se
beneficiaram na época, mas depois perderam o rumo", relatou Borges.
Felipe Paulino, o garoto que toma um tiro no pé do Zé Pequeno, deixou de ser ator.... |
por causa de problemas familiares; hoje é menor aprendiz em um hotel no Rio (Foto: Felix Lima/Folhapress) |
O documentário mostrará o
destino de quase 30 atores. Metade continua atuando, quatro se envolveram com
crimes e drogas e o restante desistiu ou não conseguiu seguir a carreira
artística.
Com dificuldades financeiras
para concluir o documentário, eles correm contra o tempo para não perder a
efeméride de dez anos e conseguir participar do Festival do Rio, em setembro. Felipe
Paulino, hoje com 18 anos, atuou em uma das cenas mais polêmicas do longa. Seu
personagem leva de Zé Pequeno (Leandro Firmino) um tiro no pé. Após o filme,
enfrentou problemas familiares na administração de sua carreira de ator mirim.
Hoje, é menor aprendiz em um hotel do Rio. "Eu ainda tenho o sonho de ser
ator", afirmou. Já o colega de cena hoje se sustenta com os cachês de
ator.
Jonathan Haagensen, o Cabeleira, e Roberta Rodrigues, a Berenice |
Jonathan Haagensen, o Cabeleira, é ator e modelo, participou do reality show "A Fazenda" e do filme "Bróder", de Jeferson De (Foto: Mastrangelo Reino/Folhapress) |
Firmino atuou em séries como
"A Diarista" (Globo), e filmes como o inédito "Totalmente
Inocentes", de Rodrigo Bittencourt, paródia do gênero "favela
movie", consagrado com "Cidade de Deus".
Roberta Rodrigues, a Berenice, participou da novela "Insensato Coração" e de filmes como "Desenrola", de Rosane Svartman (Foto: Paula Giolito/Folhapress) |
Apesar do pequeno papel que
teve no longa, Thiago Martins desponta hoje como um dos galãs da novela das
21h, "Avenida Brasil" (Globo). Preocupados com o destino dos atores
após o filme, Meirelles e a codiretora Kátia Lund ajudaram a transformar a
oficina de interpretação criada para os quase 200 jovens pré-selecionados para
a produção em um projeto social com uma produtora e uma escola de cinema. Chamado
hoje de Cinema Nosso, o projeto é presidido por um dos atores do filme, Luis
Carlos Nascimento.
Dez anos de "Cidade de
Deus"
ESTIGMA
Douglas Silva, o Dadinho, atuou na série de TV "Cidade dos Homens"... |
...e hoje participa do programa "Esquenta", de Regina Casé. Darlan Cunha (à direita) (Foto: Daniela Cantagalli) |
Baseado no livro homônimo de
Paulo Lins --que levou 15 anos até lançar outra obra (leia crítica na pág.
E4)--, o filme retrata a comunidade carioca desde a criação nos anos 1960 até
os anos 1980, durante uma guerra entre as gangues de Zé Pequeno e Mané Galinha
(Seu Jorge). O local tem hoje 36 mil habitantes, segundo o IBGE. Parte deles
diz que, após o filme, ficou estigmatizada em outras regiões do Rio.
"No filme, 99% das pessoas
eram criminosas. Na época, quem dizia que era da Cidade de Deus não conseguia
emprego. Hoje ainda há preconceito", disse o morador Roberto de Carvalho,
55. "O problema é a generalização. Não se pode dizer que todo jovem de cor
que mora nesses locais é violento", diz a antropóloga Alba Zaluar,
professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. "Qual favela não é
estigmatizada?", rebate Lins. Para ele, o livro e o filme foram essenciais
para atrair investimentos públicos para o local.
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